Erradicar o flagelo exige mudar de política

Pobreza tem causas<br>e responsáveis

Armindo Miranda

O nú­mero dos que vivem na po­breza ab­so­luta e abaixo do li­miar da po­breza tem vindo a au­mentar mesmo na mai­oria dos países de­sen­vol­vidos e em de­sen­vol­vi­mento. Es­tudos re­centes in­dicam que, a nível do pla­neta, cerca de 1,4 mil mi­lhões de pes­soas (20% da po­pu­lação mun­dial) «vivem» em si­tu­ação de po­breza ab­so­luta (menos de 1,25 dó­lares por dia) e 1,7 mil mi­lhões (25% da po­pu­lação mun­dial) vivem no li­miar da po­breza. In­dicam ainda que nos EUA, o país que mais gasta em des­pesas mi­li­tares, a po­breza está em cres­ci­mento e atinge va­lores nunca vistos desde 1960. Em 2012, os 1 por cento mais ricos nos EUA ar­re­ba­taram 25 por cento dos ren­di­mentos to­tais do país.

Tem vindo a crescer a cons­ci­ência de que a po­breza con­fi­gura uma vi­o­lação dos di­reitos hu­manos e de que os go­vernos de­ve­riam criar con­di­ções para a sua er­ra­di­cação

LUSA

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A si­tu­ação na União Eu­ro­peia é também de agra­va­mento das de­si­gual­dades so­ciais e da po­breza. Dados da Rede Eu­ro­peia Anti-Po­breza (EAPN), ac­tu­a­li­zados já em 2015, in­dicam que em 2013 «24.5 por cento da po­pu­lação eu­ro­peia (apro­xi­ma­da­mente 122.6 mi­lhões de pes­soas na UE28) eram con­si­de­radas como es­tando em risco de po­breza e/​ou ex­clusão so­cial», de acordo com a de­fi­nição adop­tada pela Es­tra­tégia 2020.

Em termos de gé­nero, são as mu­lheres que se en­con­tram em maior risco de po­breza e de ex­clusão so­cial (25.4%).

Em termos etá­rios e para ambos os sexos, é o grupo com idades com­pre­en­didas entre os 18 e os 24 anos (mais de 30%) que se en­contra em maior risco de po­breza e de ex­clusão so­cial. As cri­anças, com idades até aos 18 anos, cons­ti­tuíam o se­gundo grupo mais vul­ne­rável à po­breza e à ex­clusão so­cial com 27.6 por cento.

A si­tu­ação dos imi­grantes também é sig­ni­fi­ca­ti­va­mente grave ao nível da UE. «Em 2013, 34.4 por cento das pes­soas que vi­viam num país da UE que não era aquele onde nas­ceram, es­tavam em risco de po­breza e de ex­clusão so­cial».

Tudo isto acon­tece num tempo em que os avanços e con­quistas da ci­ência e da téc­nica, se postos ao ser­viço da hu­ma­ni­dade, pos­si­bi­li­ta­riam ní­veis de de­sen­vol­vi­mento e eman­ci­pação do ser hu­mano nunca antes ex­pe­ri­men­tados. E que só não se ve­ri­ficam porque, a par desta dra­má­tica e in­digna si­tu­ação para mi­lhões de seres hu­manos, cresce em igual pro­porção a con­cen­tração da ri­queza.

Tendo como ali­cerce a ex­plo­ração, fa­bu­losos lu­cros di­rectos e verbas dos or­ça­mentos de Es­tado, rou­badas aos sa­lá­rios dos tra­ba­lha­dores, às pen­sões e re­formas, são trans­fe­ridos para os grupos eco­nó­micos e ban­queiros, au­tên­ticos pa­ra­sitas da des­graça alheia.

A con­tra­dição – que Marx iden­ti­ficou como a con­tra­dição fun­da­mental do ca­pi­ta­lismo – é fla­grante e tem de ser re­sol­vida pela luta re­vo­lu­ci­o­nária dos povos. Os prin­ci­pais meios de pro­dução, agora pri­vados, têm de passar a ter ca­rácter so­cial em con­for­mi­dade com o ca­rácter so­cial da pro­dução de me­di­ca­mentos, de bens ali­men­tares e ou­tros bens es­sen­ciais à vida do ser hu­mano. Neste quadro em que a na­tu­reza ex­plo­ra­dora do ca­pi­ta­lismo é cada vez mais evi­dente, re­força-se a ac­tu­a­li­dade do pro­jecto co­mu­nista e a ne­ces­si­dade de par­tidos co­mu­nistas com in­de­pen­dência po­lí­tica, or­gâ­nica e ide­o­ló­gica em re­lação aos in­te­resses do ca­pital. Par­tidos da classe ope­rária e dos tra­ba­lha­dores em geral. Dos ex­plo­rados e opri­midos.

Po­breza au­mentou com
a po­lí­tica de di­reita

No nosso País «os dados pro­vi­só­rios do INE in­dicam que, em 2014, 27.5 por cento da po­pu­lação re­si­dente em Por­tugal en­con­travam-se em risco de po­breza ou ex­clusão so­cial». «Desde 2007, as cri­anças apre­sentam-se como o grupo etário com maior vul­ne­ra­bi­li­dade à po­breza e desde 2003 que a taxa de risco de po­breza junto das cri­anças per­ma­nece su­pe­rior a 20 por cento, sendo ac­tu­al­mente de 25,6 por cento». «Em 2013, 23 por cento dos agre­gados fa­mi­li­ares com cri­anças de­pen­dentes es­tavam em risco de po­breza, en­quanto esta taxa era de 15.8 por cento para agre­gados sem cri­anças de­pen­dentes».

Se­gundo ainda dados do INE, são cerca de dois mi­lhões e 700 mil os por­tu­gueses a viver abaixo do li­miar da po­breza e destes, a grande mai­oria são as­sa­la­ri­ados, re­for­mados e pen­si­o­nistas. Quer isto dizer que as causas es­sen­ciais da po­breza são os baixos sa­lá­rios e as baixas pen­sões e re­formas, é o de­sem­prego e a pre­ca­ri­e­dade, é o roubo nos sa­lá­rios e nas pen­sões e a in­su­por­tável carga fiscal que re­duzem dras­ti­ca­mente o ren­di­mento das fa­mí­lias. É o agra­va­mento da ex­plo­ração dos tra­ba­lha­dores, com a trans­fe­rência di­recta dos ren­di­mentos do tra­balho para o ca­pital através da re­dução de sa­lá­rios, do au­mento do ho­rário de tra­balho, do não pa­ga­mento do tra­balho ex­tra­or­di­nário, entre ou­tros. A parte do tra­balho na dis­tri­buição do Ren­di­mento Na­ci­onal re­duziu-se e re­pre­sentou, em 2014, apenas 44,6 por cento, en­quanto a parte do ca­pital e ou­tros ren­di­mentos atingem 55,4 por cento.

Uma re­a­li­dade que se am­pliou com a drás­tica des­va­lo­ri­zação de um con­junto de pres­ta­ções so­ciais, no­me­a­da­mente o Ren­di­mento So­cial de In­serção, e da co­ber­tura da pro­tecção so­cial no de­sem­prego, na do­ença e na ve­lhice. Nos úl­timos cinco anos 575 mil cri­anças viram-se pri­vadas do abono de fa­mília. As des­pesas com a edu­cação que re­tiram anu­al­mente às fa­mí­lias com dois ou mais fi­lhos uma média de 1078 euros. As des­pesas com a saúde que os por­tu­gueses pagam já em mais de 50 por cento do total. Os au­mentos das des­pesas com os trans­portes, a ha­bi­tação, etc. As­cende a 165 mil o nú­mero de pes­soas a quem foi re­ti­rado o Ren­di­mento So­cial de In­serção. 20 mil idosos viram cor­tado o com­ple­mento so­li­dário, si­tu­ação que se agravou nos pri­meiros meses de 2015. No lar de mi­lhares de fa­mí­lias, a fome ou já se sentou à mesa, ou anda a rondar a casa. En­quanto isso, au­mentam es­can­da­lo­sa­mente a ri­queza e os lu­cros do grande ca­pital.

Re­fe­rindo dados de 2012, re­vistas da es­pe­ci­a­li­dade dão nota de que as 25 mai­ores for­tunas au­men­taram 2,3 mil mi­lhões de euros, es­tando ava­li­adas em 16,7 mil mi­lhões de euros, 10 por cento do PIB. Em 2013, dados vindos a pú­blico re­ferem que au­mentou o nú­mero de mul­ti­mi­li­o­ná­rios (800 para 870, com for­tunas su­pe­ri­ores a 25 mi­lhões de euros). Se­gundo os dados do INE, em 2013, 20 por cento da po­pu­lação com maior ren­di­mento re­cebia apro­xi­ma­da­mente 6.2 vezes o ren­di­mento dos 20 por cento da po­pu­lação com o ren­di­mento mais baixo. Esta de­si­gual­dade é ainda maior quando ve­ri­fi­camos que 10 por cento da po­pu­lação mais rica au­fere 11.1 vezes o ren­di­mento dos 10 por cento da po­pu­lação mais pobre (10.7 em 2012 e 10.0 em 2011).

É por estas e não por ou­tras ra­zões que a fome e a mi­séria grassam nos lares de muitos por­tu­gueses. A grande bur­guesia in­co­mo­dada, mas so­bre­tudo in­quieta, com as con­sequên­cias so­ciais e po­lí­ticas do alas­tra­mento da po­breza, no plano ide­o­ló­gico faz passar a ideia de que a po­breza é uma fa­ta­li­dade que atinge quem não tem sorte, quem não se es­força o su­fi­ci­ente, ou quem não quer tra­ba­lhar. Daqui con­clui que a res­pon­sa­bi­li­dade úl­tima das si­tu­a­ções de po­breza ra­dica nos pró­prios po­bres. Outra linha ide­o­ló­gica que a classe do­mi­nante con­tinua a di­fundir e com o Natal à porta vai re­gressar em força, con­siste em tentar re­duzir as mar­gens da per­cepção da po­breza iso­lando-a nas si­tu­a­ções mais ex­tremas de mi­séria, como pe­dintes ou sem abrigo, entre ou­tros. Esta visão da po­breza convém ao grande ca­pital dando força à ideia as­sis­ten­ci­a­lista ainda muito ge­ne­ra­li­zada de que é apenas ne­ces­sário ga­rantir a so­bre­vi­vência dos po­bres sem con­tudo al­terar a sua si­tu­ação. Como se os po­bres de­se­jassem ter a po­breza como forma de vida!

Mas tem vindo a crescer a cons­ci­ência de que a po­breza con­fi­gura uma vi­o­lação dos di­reitos hu­manos e de que os go­vernos de­ve­riam criar con­di­ções para a sua er­ra­di­cação. De tal forma tem ganho força esta ideia que a As­sem­bleia da Re­pú­blica de­clarou, em 2008, por con­senso, em duas re­so­lu­ções (10/​2008, de 19 de Março e 31/​2008, de 23 de Julho) a po­breza como uma vi­o­lação dos di­reitos hu­manos e co­meteu aos go­vernos a ta­refa de im­ple­mentar as po­lí­ticas pú­blicas no sen­tido de er­ra­dicar a po­breza no nosso País. O que su­cedeu como sa­bemos e aqui fica de­mons­trado, foi exac­ta­mente o con­trário: os par­tidos da po­lí­tica de di­reita PS, PSD, e CDS res­pon­sá­veis por esta in­digna si­tu­ação para uma parte sig­ni­fi­ca­tiva do povo por­tu­guês têm vindo a agravá-la, tendo como con­sequência di­recta da po­lí­tica do Go­verno PSD e CDS am­pliado este fla­gelo so­cial a que é pre­ciso pôr termo.

 
Eixos es­sen­ciais e pro­postas do PCP

para o com­bate à po­breza
 

Au­mento dos sa­lá­rios. O efec­tivo com­bate à po­breza, tem de passar pelo au­mento dos sa­lá­rios. Uma po­lí­tica de va­lo­ri­zação dos sa­lá­rios exige:

  • O au­mento real dos sa­lá­rios e a ele­vação da sua par­ti­ci­pação no Ren­di­mento Na­ci­onal;

  • A su­bida do sa­lário mí­nimo na­ci­onal para os 600 euros no início de 2016 e a sua evo­lução pro­gres­siva anual para res­ponder às ne­ces­si­dades bá­sicas dos tra­ba­lha­dores e suas fa­mí­lias;

  • O fim dos cortes sa­la­riais e a re­po­sição in­te­gral dos sa­lá­rios, sub­sí­dios e pen­sões re­ti­rados na Ad­mi­nis­tração Pú­blica e Sector Pú­blico bem como o des­con­ge­la­mento das pro­gres­sões sa­la­riais e pro­fis­si­o­nais;

  • A re­po­sição do pa­ga­mento dos com­ple­mentos de re­forma em em­presas do Sector Em­pre­sa­rial do Es­tado;

  • Re­po­sição ime­diata e in­te­gral de ven­ci­mentos, sub­sí­dios, pen­sões e com­ple­mentos re­ti­rados aos tra­ba­lha­dores da Ad­mi­nis­tração Pú­blica e do Sector Em­pre­sa­rial do Es­tado.

Cri­ação de postos de tra­balho. O pro­jecto de de­sen­vol­vi­mento eco­nó­mico que dá corpo à Po­lí­tica Pa­trió­tica e de Es­querda pro­posto pelo PCP e onde o au­mento da pro­dução na­ci­onal tem papel es­sen­cial, criará no seu pro­cesso de de­sen­vol­vi­mento cen­tenas de mi­lhares de postos de tra­balho. Além da me­lhoria das con­di­ções de vida dos por­tu­gueses no ime­diato, dando com­bate efec­tivo à po­breza, vai gerar de forma subs­tan­cial mais re­ceitas para a Se­gu­rança So­cial. Con­forme consta no nosso pro­grama elei­toral, só a apli­cação das 35 horas a todos os tra­ba­lha­dores ge­raria a ne­ces­si­dade de criar mais 440 mil postos de tra­balho para ga­rantir o mesmo nível de pro­dução.

Fun­ções so­ciais do Es­tado. As fun­ções so­ciais do Es­tado têm um papel muito im­por­tante na luta contra a po­breza e pela sua er­ra­di­cação, desde logo no au­mento das pen­sões e re­formas; no alar­ga­mento dos cri­té­rios de acesso e pro­lon­ga­mento do pe­ríodo de atri­buição do sub­sídio de de­sem­prego e do sub­sídio so­cial de de­sem­prego; na eli­mi­nação da so­bre­taxa de IRS a partir de 2016; cri­ação de dez es­ca­lões deste im­posto e au­mento da de­dução à co­lecta para baixos e mé­dios ren­di­mentos; na re­po­sição da uni­ver­sa­li­dade do abono de fa­mília com a va­lo­ri­zação dos seus mon­tantes; na as­sis­tência mé­dica que para o PCP deve ser uni­versal e gra­tuita, co­me­çando desde já pela re­vo­gação das taxas mo­de­ra­doras; na ga­rantia de que todas as cri­anças a partir dos três anos terão lugar na rede pú­blica pré-es­colar; na dis­tri­buição gra­tuita dos ma­nuais es­co­lares a todos os alunos do en­sino obri­ga­tório. E ainda entre ou­tras me­didas:

im­ple­men­tação do Pro­grama Na­ci­onal de Com­bate à Pre­ca­ri­e­dade e ao Tra­balho Ilegal;

eli­mi­nação da so­bre­taxa de IRS a partir de 2016, cri­ação de dez es­ca­lões deste im­posto e au­mento da de­dução à co­lecta para baixos e mé­dios ren­di­mentos;

eli­mi­nação dos be­ne­fí­cios fis­cais aos grupos eco­nó­micos e fi­nan­ceiros e tri­bu­tação efec­tiva de todos os ren­di­mentos ge­rados no País;

re­versão da taxa do IVA para seis por cento na elec­tri­ci­dade e gás na­tural;

va­lo­rizar e alargar o passe so­cial nas áreas me­tro­po­li­tanas de Lisboa e Porto.

O povo por­tu­guês ma­ni­festou no pas­sado dia 4 a von­tade e a ne­ces­si­dade de haver uma mu­dança de po­lí­tica, as­su­mida em di­versas oca­siões por di­versos par­tidos du­rante a cam­panha elei­toral. Por isso der­rotou a co­li­gação de di­reita e a sua po­lí­tica. Pela nossa parte tudo fa­remos para que esse ob­jec­tivo seja con­cre­ti­zado.




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De acordo com o INE, em Agosto de 2015 o de­sem­prego em Por­tugal co­meçou de novo a au­mentar, tendo sido des­truídos, nesse mês, 41 300 em­pregos. Se­gundo dados do INE, que estão dis­po­ní­veis no seu site (www.ine.pt ), entre Julho e Agosto de 2015, o de­sem­prego ajus­tado da sa­zo­na­li­dade au­mentou de 606,6 mil para 623 mil (+16 400), e o em­prego também ajus­tado da sa­zo­na­li­dade di­mi­nuiu de 4524,1 mil para 4482,8 mil (- 41 300).